A pré-eclâmpsia (PE) é uma síndrome hipertensiva que ocorre durante a gravidez e resulta em risco e impacto significativo em indicadores relacionados à saúde materna e infantil. Está relacionada à morte materna e perinatal e causa limitações definitivas à saúde materna e problemas graves resultantes da prematuridade eletiva associada. No Brasil, o PE é a principal causa da prematuridade eletiva.
Estima-se que a PE ocorra em 3-5% das gravidezes no mundo. Especificamente no Brasil, uma revisão sistemática identificou incidência de 1,5%, mas acredita-se que esta informação está subestimada e varia de acordo com as regiões do país. Um estudo brasileiro indicou que a prevalência estimada de eclampsia é de 0,2% nas áreas mais desenvolvidas, com taxa de mortalidade materna de 0,8%, enquanto que nas regiões menos favorecidas esta prevalência aumenta para 8,1%, com taxa de mortalidade materna correspondente a 22,0%.
A PE é consideravelmente mais prevalente em países de baixa renda e uma possível explicação para esta discrepância são as diferenças alimentares, particularmente a deficiência de cálcio.
A ingestão recomendada de cálcio para mulheres grávidas varia entre 1000 e 1300 mg/dia, dependendo da faixa etária, dentre outras condições maternas. A ingestão real entre mulheres grávidas geralmente não atende a recomendação, em alguns casos, até mesmo em países com disponibilidade suficiente de alimentos ricos em cálcio.
Embora a ingestão adequada de cálcio através de alimentos ricos em cálcio deva ser encorajada, há evidências experimentais disponíveis que direcionam para a ideia de que a suplementação de cálcio pode gerar importantes ganhos de saúde, sendo considerada uma intervenção promissora para a prevenção da PE.
Uma meta-análise de 13 ensaios clínicos randomizados com 15730 mulheres grávidas mostrou uma redução global de 55% no risco de PE entre as mulheres que receberam suplementos de cálcio (>1.000 mg/dia) desde a segunda metade da gravidez até o parto, em relação às mulheres recebendo suplementos de placebo. A redução do risco foi mais pronunciada entre as mulheres com maior risco de transtornos hipertensivos e entre mulheres com baixa ingestão dietética de cálcio (ingestão média <900 mg/dia).
De acordo com uma revisão da Cochrane Library, em 12 estudos envolvendo 15206 mulheres grávidas, o suplemento de cálcio reduziu o risco de PE (RR: 0,7) e hipertensão (RR: 0,48). Este efeito foi maior entre as mulheres grávidas com alto risco de PE e entre aqueles com dieta com baixo teor de cálcio. Não houve aumento nos eventos adversos maternos ou fetais na população estudada.
A suplementação com cálcio é recomendada a partir da 12ª semana de gestação e apenas para mulheres grávidas com alto risco de desenvolvimento de PE, especialmente aquelas com dieta com baixo teor de cálcio. Estudos sobre suplementação de cálcio realizados com mulheres grávidas de baixo risco não apresentam diminuição da frequência de PE, enquanto a maioria dos ensaios randomizados controlados com mulheres grávidas com alto risco de PE apresentaram uma diminuição significativa do transtorno.
Apesar de seu efeito protetor documentado, preço baixo (quando comparado aos custos com tratamentos) e segurança, a suplementação de cálcio ainda não faz parte do atendimento pré-natal padrão na maioria dos países. A Organização Mundial da Saúde só recomenda suplementos de cálcio como parte do atendimento pré-natal em populações onde a ingestão de cálcio é baixa.
A suplementação de cálcio baseia-se na relação entre uma dieta com pouco cálcio e aumento da incidência de eclâmpsia. Além disso, em populações de baixa renda com dietas ricas em cálcio, há menor incidência de PE e eclampsia. Apenas o uso de cálcio e de baixa dose de aspirina é recomendado e considerado eficaz na prática clínica. A suplementação de cálcio e o uso de pequenas doses diárias de aspirina para grupos em risco são as únicas alternativas que demonstraram algum grau de eficácia em ensaios clínicos randomizados (Grau A de recomendação). O uso de suplementos e medicamentos, sempre deve ser feito sob a orientação do profissional de saúde.
Referências bibliográficas
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