O câncer é um importante problema de saúde pública, sendo uma das principais causas de mortalidade e morbidade no mundo [1]. Segundo a International Agency for Research on Cancer (IARC), órgão da Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2020, o mundo alcançou a marca de quase 20 milhões de novos diagnósticos de câncer [2]. Já no Brasil, a estimativa do Instituto Nacional do Câncer (INCA), para o triênio 2020-2022, é de mais de 600mil novos casos [3].
Apesar das pesquisas em busca de novas abordagens terapêuticas terem avançado bastante nas últimas décadas, a maioria dos tumores ainda é tratado com a quimioterapia, técnica bastante conhecida por seus intensos efeitos colaterais. A toxicidade dos quimioterápicos promove a formação de radicais livres e intenso estresse oxidativo [4]. Dentre as consequências fisiológicas, a mucosite oral se destaca como efeito adverso para cerca de 40% que recebem quimioterapia e até 60% dos que recebem radioterapia [5, 6].
O desenvolvimento da mucosite oral é um processo que vai de uma fase inflamatória até uma fase ulcerativa, com perda da integridade da mucosa [7, 8]. Na condição das ulcerações, ocorre ainda um aumento do risco de deficiências nutricionais, além de facilitar a entrada de bactérias, fungos e vírus [9]. Atualmente, o tratamento para a mucosite oral encontra-se limitado ao uso de agentes anti-inflamatórios, anestésicos locais e terapia a laser, abordagens de custo elevado e com outros efeitos colaterais específicos [5]. Por outro lado, a literatura médico-científica tem demonstrado que, dada sua natureza antioxidante, alguns micronutrientes apresentam atividade importante no controle dos efeitos colaterais da quimioterapia, como a mucosite oral [4].
Curcumina
A curcumina é um composto encontrado na cúrcuma, também conhecido como açafrão-da-terra ou tumérico (Curcuma longa). Os efeitos positivos da curcumina para o controle e/ou tratamento da mucosite oral têm sido relacionados com seu potencial antiproliferativo, quimiopreventivo, cicatrizante, antioxidante e anti-inflamatório [10]. Estudos clínicos com pacientes oncológicos adultos e pediátricos comprovaram a segurança bem como a eficácia da curcumina na prevenção ou redução de severidade da mucosite oral [11-14].
Zinco
O zinco é um nutriente essencial para a saúde humana, e sua administração como medida profilática e terapêutica para a mucosite oral tem um amplo espectro de mecanismos de ação [15]. O zinco exerce funções importantes como a supressão de genes promotores de apoptose, promoção da atividade anti-inflamatória para a cicatrização da mucosa lesionada e recuperação do sistema imune do paciente oncológico [16].
Recentemente, duas metanálises comprovaram o papel positivo da suplementação de zinco para controle da mucosite oral. Foi observado que a suplementação com zinco se mostrou uma estratégia promissora para a prevenção e tratamento da mucosite oral, por atrasar sua ocorrência e reduzir significativamente a gravidade das lesões [17, 18].
Selênio
O papel nutricional do selênio no organismo humano é decorrente da atividade das selenoproteínas, cujas principais funções incluem controle do estresse oxidativo, do processo inflamatório e manutenção do sistema imune [19]. Assim, o selênio tem sido aplicado na prática clínica oncológica, especificamente no controle dos efeitos colaterais da quimioterapia e radioterapia, incluindo a mucosite oral [20-23].
Neste cenário, um estudo duplo-cego controlado por placebo teve o objetivo de avaliar os efeitos da suplementação com selênio em pacientes submetidos a sessões de quimioterapia de alta intensidade. Os autores observaram que o grupo suplementado (400 µg/dia) apresentou uma redução significativa da incidência de mucosite oral severa [22].
Dentro de um contexto no qual os efeitos colaterais do tratamento são, às vezes, tão doloridos e complexos quanto os sintomas da própria doença, a qualidade de vida do paciente passa a ter uma proporção ainda maior. A suplementação com estes nutrientes pode auxiliar o paciente oncológico frente à severidade da mucosite oral, como uma opção profilática e terapêutica, acessível e benéfica.
Produzido por: Pietra Sacramento Prado, BSc e Renata Cavalcanti, PhD
Referências:
1. WHO. Cancer, Fact Sheet: World Health Organization Media Centre; 2018. 2. IARC/OMS. 2020; https://gco.iarc.fr/today/data/factsheets/cancers/39-All-cancers-fact-sheet.pdf 3. Brasil M.d.S., INCA. 2020; https://www.inca.gov.br/sites/ufu.sti.inca.local/files//media/document//estimativa-2020-incidencia-de-cancer-no-brasil.pdf 4. Conklin K.A. Nutr Cancer. 2000;37(1):1-18. 5. Singh V., Singh A.K. Natl J Maxillofac Surg. 2020;11(2):159-168. 6. Kostler W.J., Hejna M., Wenzel C., Zielinski C.C. CA Cancer J Clin. 2001;51(5):290-315. 7. Cardoso L.M., Pansani T.N., Hebling J., de Souza Costa C.A., et al. Arch Oral Biol. 2021;127:105159. 8. Sonis S.T., Elting L.S., Keefe D., Peterson D.E., et al. Cancer. 2004;100(9 Suppl):1995-2025. 9. Basile D., Di Nardo P., Corvaja C., Garattini S.K., et al. Cancers (Basel). 2019;11(6). 10. Goel A., Kunnumakkara A.B., Aggarwal B.B. Biochem Pharmacol. 2008;75(4):787-809. 11. Rao S., Dinkar C., Vaishnav L.K., Rao P., et al. Integr Cancer Ther. 2014;13(3):201-210. 12. Saldanha SP A.V. J Clin Res Bioeth. 2014;5:200. 13. Patil K., Guledgud M.V., Kulkarni P.K., Keshari D., et al. J Clin Diagn Res. 2015;9(8):ZC59-62. 14. Delavarian Z., Pakfetrat A., Ghazi A., Jaafari M.R., et al. Spec Care Dentist. 2019;39(2):166-172. 15. Lalla R.V., Bowen J., Barasch A., Elting L., et al. Cancer. 2014;120(10):1453-1461. 16. Thomsen M., Vitetta L. Curr Opin Clin Nutr Metab Care. 2019;22(5):365-370. 17. Chaitanya N.C., Shugufta K., Suvarna C., Bhopal T., et al. J Nutr Sci Vitaminol (Tokyo). 2019;65(2):184-191. 18. de Meneses A.G., Normando A.G.C., Porto de Toledo I., Reis P.E.D., et al. J Oral Pathol Med. 2019. 19. Rayman M.P. Lancet. 2012;379(9822):1256-1268. 20. Yarom N., Hovan A., Bossi P., Ariyawardana A., et al. Support Care Cancer. 2019;27(10):3997-4010. 21. Sieja K., Talerczyk M. Gynecol Oncol. 2004;93(2):320-327. 22. Jahangard-Rafsanjani Z., Gholami K., Hadjibabaie M., Shamshiri A.R., et al. Bone Marrow Transplant. 2013;48(6):832-836. 23. Lee S. PeerJ. 2015;3:e765.